Especial

O contributo dos artistas no alcance da Independência Nacional

Armindo Canda

Jornalista

A música, a dança e o teatro tiveram um papel importante na consciencialização das comunidades, para que o país se tornasse independente

14/11/2023  Última atualização 07H23
© Fotografia por: DR

Os fazedores de cultura, com realce para a dança, a música, o teatro, a literatura e as artes plásticas tiveram um contributo significativo para o alcance da Independência Nacional, praticando acções de foro revolucionário.

Nas celebrações do 48º ano da Independência Nacional, o Jornal de Angola ouviu alguns artistas que de forma directa contribuíram com as suas artes em prol da libertação e do alcance da independência. Os interlocutores foram unânimes, ao afirmarem que os fazedores culturais escreveram páginas brilhantes sobre a resistência anticolonial do povo angolano.

Para o músico Carlos Lamartine, os artistas, no geral, e os músicos, em particular, ajudaram de uma forma directa, na Luta de Libertação Nacional, através das suas canções, mobilizaram as populações na época.

"As músicas feitas naquela altura, tinham conteúdos patriótico e sociais, capazes de levar o povo todo aderir a luta de libertação. Conquistamos a Independência e hoje temos um ambiente mais democrático, solidariedade institucional, nacional, social e uma vida de paz”, realçou.

Nas músicas, continuou, estavam imbuídos é revelado pela espiritualidade da nossa ancestralidade, resultando na mobilização efectiva do povo, "digo isto porque sou testemunha participativa nesses feitos”, tendo acrescentando que tantos os mais velhos como jovens tiveram uma participação no alcance da Independência.

"Graças a estas participações, hoje vivemos com mais tranquilidade e com um espírito de dever cumprido”.

Além das armas usadas, referiu, a música, a dança, tiveram um papel importante na consciencialização das comunidades, para que o país hoje ganhe a independência nacional, e viva em democracia.

"Era um tempo difícil, mas com a contribuição da própria opressão, brotavam também, da alma criadora dos artistas e dos grupos músicas e artísticos as fortes composições se tornaram inesquecíveis e, ainda são enigmáticas com as músicas de Abel Muinha Dicota, do Conjunto de Rebita União Elite, de José Alberto, de Fontes Pereira, nos anos trinta, no século XX”.

Carlos Lamartine fez menção de alguns artistas que contribuíram para alcançar da Independência, como Artur Adriano, Eduardo André, o romance de Cidrália, intitulado como "Criação musical de zé Gombe”, Teófilo José da Costa, Ginga Dudinha e outros, tiveram um papel preponderante na culturalidade da Luta da Libertação Nacional, bem como, para a solidez da construção da pátria angolana em toda a sua dimensão.

O músico contou, ainda, que a partir do dia nove de Novembro de 1975, estava a trabalhar directamente com o grupo que fez o hino nacional de Angola e, no dia seguinte estava a ensaiar o coral composto por um total de 200 pessoas, enquanto que na meia noite do dia 11, se encontrava no Largo Primeiro de Maio a dirigir o grupo coral que cantava o hino nacional.

"Quando eram 12h00 do mesmo dia, estava na Câmara Municipal de Luanda, o actual Governo Provincial, onde fomos cantar o hino nacional e, mais tarde, nos dirigimos até à Rádio Nacional para fazer a gravação da canção que hoje é o hino nacional da República de Angola”, recordou. 

Na ocasião, Dom Caetano, referiu que os artistas tiveram contribuições muito valiosas e inapeláveis para a conquista da Independência Nacional.

"Dez anos depois da Independência, cresceu muito o movimento musical em torno da canção política, de forma a perseverar os ganhos alcançados pela liberdade. Com o passar dos anos as contribuições viraram para questões sociopolíticas, ao intervir com músicas de protesto e, tudo isso foi válido para os feitos da nossa própria autonomia”.

Os artistas, frisou, estão conscientes porque com a independência, ganharam maior espaço e liberdade de intervenção, "hoje os músicos conseguiram constituir um mercado musical, embora deficiente, mas dando uma certa produção ao longo desses anos”.

Dom Caetano explicou, igualmente, que tanto no período colonial, como nos primeiros anos pós-independência se tornaram livres, mas hoje com a política da economia de mercado, têm um pouco de maior liberdade a intervenção como é o caso de Paulos Flores e Dog Murras.

"Hoje a música que faz  parte do lençol da crítica do poder político, e é bom que se reconheça a liberdade de consciência das pessoas e, o músico jamais pode estar a quem deste directo, porque deve persuadir para a construção da nação, ao mesmo tempo dissuadir naquilo que não é digno na convivência social”.

Na sua visão, a arte teve uma relação muito conjugal e biótica para o alcance da Independência, a título de exemplo, os versos de António Agostinho Neto, primeiro Presidente de Angola, foram produtos de muitas canções dentro do music call nacional.

"O segundo Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, durante a sua juventude, estava ligado à música e fez parte dos Quimbamba dos Ritmos, um conjunto fundado no Sambizanga, por Brito Sozinho e Pedro de Castro Van Dúnem Loy. A arte sempre esteve associada às correntes políticas para que se conseguisse alcançar a independência do nosso país”, referiu o artista.

A política e a arte, sublinhou, sempre estiveram correlacionadas, porque a máquina política funciona através das propagandas e, para isso, é necessário que o homem das artes faça parte da mesma.

A música, a dança e a literatura, referiu, contribuíram significativamente para a conquista da nossa liberdade do colonialismo, porque ao longo da independência surgiram muitos escritos com destaque para Luandino Vieira, Viriato da Cruz, António Jacinto, Mendes de Carvalho, "Uanhenga Xitu”.

"Quando falamos de teatro vamos olhar para Armando Correia de Azevedo, Rodão Ferreira, que faziam parte do grupo teatral Gongo, deram um grande contributo para que afastássemos o colonizador”.

Quanto à dança, ressaltou que o Kituxi e seus acompanhantes nos primeiros anos da independência, e posteriormente surgiram outros grupos como Yaka e, tudo isso serviu de antecâmara para que a geração política governante pegasse nestas estruturas e tornando como espelho da nossa identidade cultural.

Dom Caetano recordou que, no dia em que se proclamava a Independência Nacional, estava em casa com os amigos, "mas estávamos a nos preparar para ir assistir o discurso do Presidente  António Agostinho Neto, com os meus pais. Éramos ainda muito miúdos. Eu tinha apenas 18 anos”. 

"Como já era noite e se tratava da conquista da  independência, era preferível andar em grupo para nos sentirmos em segurança e deixar os nossos pais mais tranquilos”, explicou.


Artistas plásticos

O pintor e escultor António Tomás Ana "Etona” disse que os artistas plásticos também deram um contributo significativo para o alcance da Independência Nacional, como é o caso de Henriques Abranches, Rui de Matos, Teresa da Gama, Marcela Costa, Massongue Afonso e outros.

"Muito dessas figuras participaram na luta de libertação nacional, usando a arte como uma ferramenta para que hoje o nosso país pudesse ser reconhecido. A arte plástica actua de forma muito lenta, mas quando entra na cabeça do indivíduo ela faz uma transformação na forma de pensar e de ser da pessoa”.

Etona lembrou, ainda, que os murais que se encontram no Hospital Militar, é um dos exemplos de como a arte plástica contribui de forma significativa para o reconhecimento de Angola.

"Os murais HM, são bíblias visíveis do contributo dos artistas na Independência do nosso país. Estas e outras obras, influenciaram de forma directa no comportamento das pessoas na época colonial, de maneira a terem um olhar crítico no que diz respeito ao conceito de desenvolvimento da nação”.

O também escultor sublinhou, igualmente, que em Luanda, podemos encontrar vários monumentos da época colonial, isso nos leva a pensar que estas participações foram tocantes e, jamais podemos falar da libertação de Angola, sem pensar no contributo que os fazedores das artes deram.

"Podemos encontrar estes monumentos em vários locais da cidade capital com destaque a embaixada Americana, junto ao Hospital Josina Machel, na Samba, perto da Maternidade Lucrécia Paim e a Rádio Nacional de Angola”.


Teatro de intervenção

O actor António de Oliveira "Delon” realçou que desde o princípio da constituição do país, as artes cénicas sempre estiveram presente na mobilização, sensibilização e na educação, de modo a despertar as consciências.

"O teatro, antes da independência, teve uma intervenção muito forte, e ajudava na libertação das consciências. No passado os angolanos tinham receio de falar publicamente aquilo que lhes vinha na alma, mas quando assistissem uma peça de teatro ficavam diferentes. Sentiam como se estivessem a dar o grito da liberdade do jugo colonial”, recordou.

O sistema de segurança policial e o de garantia do Estado português, referiu, era muito bem controlado e, para passar uma mensagem, os angolanos tinham que encontrar uma forma didáctica para fazer chegar ao remetente e isso era feito por intermédio das peças teatrais na altura. "Porque as artes cênicas eram uma fonte de inspiração a muitos políticos na época”.

Os artistas, explicou, sempre estiveram evidentes na luta de libertação nacional, tendo trocando as armas pelas artes, de maneira a fomentar na divulgação e na promoção da luta contra o opressor colonial. 

"Nos anos 70, as coisas tornaram-se mais evidentes, mas com a independência, foi o cimentar daquilo que se fez no passado e a continuidade das artes cénicas. Era necessário sermos corajosos para lutar em prol da nossa liberdade”.

António de Oliveira "Delon”, frisou, que no dia onze de Novembro de 1975, estava a trabalhar, na altura como membro da Juventude do Movimento Popular de Libertação de Angola JMPLA, "estávamos a preparar o acto da Independência, isso no largo do 1º de Maio, onde desfilavam perante a tribuna Presidencial, com a bandeira do nosso país em minha mão”.

Segundo Francisco Afonso, ex-comandante da Força Aérea Nacional (FAN), conhecido nas lides militares por "General Hanga”, a contribuição dos artistas e da arte para a Independência Nacional foi bastante importante. "Os artistas nos transmitiram várias mensagens da necessidade de transformarmos o país e, conseguimos a nossa libertação. E mesmo nos dias de hoje continuam a desempenhar um papel fundamental”, realçou.  O general contou, que no dia da luta de libertação, se encontrava em Luanda, perto do 1º de Maio, na casa de um familiar. "Não assisti de forma directa, mas ouvíamos pela rádio todas as ocorrências do dia”, concluiu.

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