Política

Alteração ao Código Penal oportuna para a competência constitucional

Yara Simão

Jornalista

O Projecto de Lei que altera o Código Penal Angolano, a ser discutido hoje, pela Assembleia Nacional, na especialidade, e já aprovado na generalidade, é oportuno para o exercício da competência constitucional em causa e salvaguardar os bens ou valores essenciais, assim como garantir a existência e a subsistência da sociedade, defendeu o advogado Veloso Malavo Issenguel, formado em Direitos Humanos.

06/05/2024  Última atualização 09H32
Diploma de iniciativa do Chefe do Estado volta a ser debatido na Assembleia Nacional e enquadra-se no processo de revisão © Fotografia por: Edições Novembro

Na opinião do jurista, o Direito deve acompanhar o progresso e a evolução social, e é neste sentido que a alteração do Código Penal Angolano, uma iniciativa do Presidente da República, procura flexibilizar e optimizar a justiça penal em Angola rumo ao progresso social e ao desenvolvimento, procurando adequar o Direito Penal à realidade angolana.

"Francisco de Vitória, citado por Cristina Queirós, em Direitos Fundamentais, a título de exemplo, deixou-nos o legado segundo o qual uma lei só a é lei quando for tolerável e racional”, realçou, acrescentando que, embora seja novo e actualizado o Código Penal Angolano, é bem verdade que o Direito Penal angolano carece de optimização, isto é, alterações no sentido de torná-lo melhor.

As vantagens disso, continuou Veloso Issenguel, visam traduzir, na vida prática, uma noção mais adequada de justiça penal na vida do cidadão, na medida em que este saberá entender que, quanto mais grave for, por exemplo, a infracção, mais elevada será a pena em função do valor do bem protegido pela lei penal, o que permite, também, gravar na mentalidade de todos, incluindo cépticos e críticos, que a justiça penal é um dos imperativos sociais e um dos mecanismos de organização, garantia e protecção dos valores fundamentais da sociedade de hoje e do amanhã.

Veloso Issenguel acredita que com a Alteração do Código Penal existe o interesse de garantir a segurança do Estado e combater outras infracções que assolam a sociedade e que levam ao retrocesso, enfraquecendo os serviços públicos na prossecução do bem comum, como por exemplo a saúde, o ensino, o acesso à água canalizada, à electricidade, bem como a falta de atenção na protecção de bens públicos, como infra-estruturas, equipamentos de instituições públicas, como hospitais, escolas e empresas públicas, o que poderá resultar em maiores dificuldades de desenvolvimento e progresso social a ponto de condicionar negativamente a governação do país.

O advogado disse estar confiante que o projecto de Lei passa na especialidade e a posterior na próxima sessão plenária da Assembleia Nacional, não pelo facto de o MPLA deter uma maioria parlamentar confortável, mas, sim, pelo facto de a iniciativa do Presidente da República ser do interesse de todo os angolanos.

Revisão do sector de Justiça

De acordo com o documento apresentado na 5.ª Reunião Plenária Extraordinária da 2.ª Sessão Legislativa da V Legislatura, da Assembleia Nacional, a presente iniciativa do Chefe de Estado enquadra-se no âmbito do processo de revisão da legislação do sector da Justiça.

O diploma visa, essencialmente, proceder a um exercício de correcção e superação de imprecisões, gralhas e insuficiências registadas aquando da publicação do Código Penal Angolano, recentemente aprovado, com vista a assegurar uma implementação e aplicação mais satisfatória deste instrumento fundamental de realização da justiça penal.

A iniciativa visa, ainda, assegurar a conformidade do quadro legal angolano relativamente às constatações do Processo de Avaliação Mútua de Conformidade e Eficácia do Sistema Nacional de Prevenção e Repressão do Branqueamento de Capitais, Financiamento do Terrorismo e da Proliferação de Armas de Destruição em Massa, a que o país foi internacionalmente sujeito.

 
Alteração das penas

De acordo com o documento, na especialidade, a presente proposta propõe-se introduzir um corpo pontual de alterações a vários artigos do Código Penal Angolano, aprovado pela Lei nº 38/20, de 11 de Novembro, no sentido de promover a correcção das insuficiências, gralhas, imprecisões ou omissões identificadas nesse curto período de vigência, bem como a conformidade e adequação do panorama de penalização de determinados crimes face ao conceito de "Crimes subjacentes”.

Caso o projecto que propõe a alteração seja aprovado pelas comissões, e passar para a próxima Reunião Plenária, uma das penas a ser alterada está relacionada ao abuso sexual, onde a lei aplica pena de prisão de seis meses a três anos a quem, sendo maior, praticar acto sexual com menor mediante pagamento ou outra contrapartida.

Outras penas dizem ainda que é condenado a uma pena de prisão de seis meses a três anos ou multa de 60 a 360 dias aquele que com fim lucrativo promover ou de qualquer outra forma prestar ajuda a cidadão estrangeiro para entrar ilegalmente em território nacional.

Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, oferecer, der ou prometer vantagem patrimonial ou não patrimonial ao funcionário ou à pessoa especialmente obrigada à prestação de serviço público, ou à terceira pessoa com o conhecimento deles, para realizar acto ou omissão inerentes aos deveres do respectivo cargo ou função, é punido com pena de prisão de 6 meses a 2 anos ou multa de 60 a 240 dias.

Consta ainda da proposta que o funcionário que, por si ou por interposta pessoa com o seu consentimento, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não-patrimonial, ou a sua promessa, para praticar acto ou omissão inerente aos deveres do cargo ou função, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de 6 meses a 2 anos ou multa de 60 a 240 dias.

Se, no caso do número anterior, o acto ou omissão for contrário aos deveres do cargo ou função, a pena é de prisão de 6 meses a 3 anos ou multa de 60 a 360 dias. Ainda sobre a proposta, consta também que o funcionário que com intenção de obter vantagem que não seja devida participar em negócio jurídico que envolva interesses patrimoniais que, no todo ou em parte, lhe cumprir, em razão do seu cargo ou das suas funções, administrar, fiscalizar, defender ou realizar é punido com pena de prisão de 6 meses a 5 anos.


Projecto de Lei de Combate ao branqueamento de capitais

O advogado penalista Sebastião Vinte e Cinco defende que a Lei 5/20, de 27 de Janeiro – Lei sobre a Prevenção e Combate ao Branqueamento de Capitais, Financiamento do Terrorismo e da Proliferação de Armas de Destruição em Massa deverá, com a alteração que se prevê para breve, tendo em conta a necessidade de observância das recomendações do Grupo de Acção Financeira (GAFI), observar a tipificação de mais crimes e o agravamento de algumas penas.

Em entrevista ao Jornal de Angola, no âmbito da proposta de Lei que altera o Código Penal, o advogado penalista Sebastião Vinte e Cinco esclareceu que o GAFI, enquanto entidade fundada pelo grupo das maiores economias mundiais, ou seja, dos sete países mais industrializados e que domina os mercados financeiros, desde 1989, ano em que foi fundado, vem se dedicando à criação de princípios e normas jurídicas com o objectivo de prevenir e combater o branqueamento de capitais, o financiamento do terrorismo e a proliferação de armas com grande poder destrutivo.

O GAFI, segundo o advogado, é um organismo intergovernamental que, mediante a divulgação das suas 40 recomendações, exerce influência sobre os Estados de todos os continentes para a adopção, nas suas jurisdições internas, medidas de prevenção e repressão aos crimes de branqueamento de capitais, de financiamento do terrorismo e de proliferação de armas de destruição em massa.

Sebastião Vinte e Cinco fez saber, ainda, que a influência e protagonismo do GAFI, no plano internacional, são cada vez maiores e o facto de ter como membros observadores instituições como a INTERPOL, o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), o Banco Central Europeu, o FMI e a OCDE demonstram bem o impacto do seu raio de acção nos mercados financeiros globais.

Esse facto, continuou, motiva países como Angola, com uma economia frágil e dependente, de estarem incluídos para melhorarem o desempenho dos seus sectores financeiros bancários e não bancários, "de modo a evitarem a repetição de situações como a que levou Angola a deixar de transaccionar dólares dos Estados Unidos por suspeitas de financiamento do terrorismo em 2015”.

Este dossier, da necessidade de se abraçar e implementar as recomendações do GAFI, de acordo com o advogado, deveria ter sido abordado desde 2015, quando o sistema financeiro bancário angolano foi punido.

"O facto de estar na liderança da equipa económica do Governo de Angola um quadro que liderou o Banco Nacional, que se reuniu com delegações da Reserva Federal dos Estados Unidos, que domina a actividade da Unidade de Informação Financeira, instituição que sempre trabalhou em estreita colaboração com o Banco Central, pode parecer determinante para que, finalmente, se iniciem os procedimentos com vista à conformação do direito interno com as recomendações do GAFI e demais instituições influenciadas por esta plataforma intergovernamental”, observou Sebastião Vinte e Cinco.

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